Nesta nova edição do Boletim decidimos convidar pessoas ilustres que conhecem bem a Freguesia de Estrela. O convite ao Professor Miguel de Castro Neto surgiu no início do ano, como forma de aliar o seu vasto conhecimento sobre Smart Cities às atividades que a Junta tinha desenvolvido até então. Boa leitura!
Os Construtores da Cidade Inteligente
Miguel de Castro Neto
Quando recebi o convite para escrever este texto, não pude deixar de sorrir, pois já perdi a conta ao número de vezes que utilizo exemplos da Estrela para ilustrar como, na prática e em estreita ligação com o cidadão, se constroem cidades mais inteligentes cumprindo os quatro desígnios referidos no Objetivo de Desenvolvimento Sustentável 11 das Nações Unidas “Cidades e Comunidades Sustentáveis”: sustentabilidade, inclusão, resiliência e segurança.
Sendo certo que este conceito do que é uma Cidade Inteligente é muitas vezes difuso e excessivamente focado na tecnologia, encontramos na Freguesia da Estrela um equilíbrio deveras interessante entre a utilização do potencial da transformação digital e a procura de qualidade de vida para quem vive, trabalha ou visita este território da cidade de Lisboa, sem nunca descurar a sustentabilidade.
Efetivamente, quando olho para a Freguesia da Estrela, vejo a materialização no terreno da definição da UNECE[1] do que é exatamente uma Smart Sustainable City, ou seja “uma cidade inovadora que utiliza tecnologias de informação e comunicação bem como outros meios, para melhorar a qualidade de vida, a eficiência das operações e serviços urbanos e a competitividade, garantindo simultaneamente que responde às necessidades das gerações presentes e futuras no que concerne aspetos económicos, sociais, ambientais e culturais”.
A construção da Cidade Inteligente baseia-se, portanto, nas características identitárias de cada território e nas qualidades diferenciadoras e criadoras das comunidades que nele habitam, trabalham ou visitam. Consiste em colocar a transformação digital ao serviço da eficiência, da sustentabilidade e da inclusão no território, para uma melhor prestação de serviços aos seus cidadãos.
Na minha interpretação de inteligência urbana, o maior desafio que enfrentamos hoje é, precisamente, perceber e tirar partido deste extraordinário caminho de transformação digital que estamos a percorrer, ou melhor, da verdadeira revolução digital que está em curso e das capacidades de “sensorização” de sistemas, equipamentos e pessoas que possuímos hoje para, com a ciência dos dados e inteligência artificial, melhorar o planeamento e a gestão dos espaços urbanos, colocando o cidadão no centro deste processo.
Hoje já não são só os computadores e as coisas que estão em constante contacto – a chamada Internet of Things (ou IoT). São também, e cada vez mais, as pessoas, com a utilização dos seus smartphones, num sistema nervoso de sensores, vivos e não-vivos, que integram o novo conceito da Internet of Everything (IoE).
Os dados ganham, por isso, um papel central em todo este processo. Neste caminho vão surgindo hoje as interrogações e preocupações, em particular a privacidade e a utilização ética dos dados pessoais que, mesmo quando lícitas, não nos devem fazer esquecer que a tecnologia e o seu uso são um meio e não um fim. O grande desafio é potenciar a partilha dos dados, em segurança e respeito pela privacidade, para criar mais negócios e empregos e, simultaneamente, melhorar o ambiente e a qualidade de vida das pessoas. Em última análise, depende de todos nós, da sociedade, a escolha do caminho que queremos seguir.
Ambicionamos criar cidades cidadãs e, na medida do possível, construir todos os dias a utopia possível, como propunha Thomas More, quando criou o termo que serviu de título para sua principal obra, escrita em latim por volta de 1516, ou arriscamos materializar a sociedade distópica imaginada por George Orwell na sua obra 1984? Na minha perspetiva, a Cidade Inteligente, com as suas soluções que já estão à vista de todos, representa a forma essencial para a concretização das ambições mais positivas das sociedades do presente e do futuro. Porque é cada vez mais conectada, participada e focada na vontade dos cidadãos.
Na Estrela, encontro hoje sinais reais de que podemos de facto sonhar a utopia e, tirando partido das atuais capacidades tecnológicas disponíveis, construir uma freguesia inteligente e sustentável, onde a revolução digital em curso cumpre a sua missão instrumental de “braço dado” com o cidadão. A favor das pessoas!
Em março de 2020, o Professor Miguel de Castro Neto destacava num texto de opinião a sua visão sobre a relação tecnológica e inovadora que a Freguesia de Estrela tem com a sua Comunidade. Certamente que em Julho de 2020 existem novas reflexões a fazer, porque o que une a realidade à ficção é que na Junta de Freguesia de Estrela continuamos aqui a trabalhar para si. Juntos vamos ficar bem.
[1] United Nations Economic Commission for Europe - http://www.unece.org